O juiz André Luiz Lopes de Souza, da Vara Criminal da comarca de Mafra, recebeu denúncia do Ministério Público de Santa Catarina contra nove pessoas por homicídio, com dolo eventual e omissão, de uma criança de um ano e 20 dias.
O caso aconteceu em junho de 2017, quando o bebê faleceu após atraso no transporte necessário para que recebesse atendimento em unidade hospitalar especializada. A falta de combustível para abastecer a ambulância do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) foi apontada como o motivo da demora. Os servidores foram responsabilizados pela negativa em aceitar abastecimento de terceiros ou de requisitar recursos em situação de emergência.
A denúncia da promotoria relata que a criança deu entrada no Hospital São Vicente de Paulo, em Mafra, na madrugada de 7 de junho de 2017, já com quadro grave de broncopneumonia, que exigia atendimento em unidade especializada disponível somente em Joinville. Ainda conforme o MP, a demora em providenciar o transporte de Mafra a Joinville teria sido uma das causas da morte – a criança faleceu no dia 10 em Joinville.
Entre os réus estão diretores e médicos do Samu. Com o recebimento da denúncia pela Justiça, os acusados passam agora a figurar como réus em ação penal pelo crime de homicídio qualificado por motivo torpe, com a relevância da omissão.
No entendimento do juiz, a ação penal se faz necessária para descobrir se a conduta dos réus foi criminalmente típica e quem teria sido responsável pela demora na transferência da criança. Ele ressaltou que o transporte do bebê não se deu de forma proativa por causa da falta de combustível nas ambulâncias do Samu, eximindo-se todos no momento da responsabilidade de providenciar o abastecimento e até recusando-se quando familiares se ofereceram para arcar com os custos.
“Não se olvide que a prestação de assistência à saúde é uma das atividades primárias do estado e sua deficiência justifica, da mesma forma, a persecução penal dos responsáveis em eventos danosos, sobretudo por conta da proibição da proteção deficiente e, mais ainda, contra o bem jurídico de maior relevância e proteção que é a vida“, destacou o juiz ao apontar o principal motivo para o recebimento da denúncia, diante da omissão penalmente relevante.
A decisão do magistrado saiu na última segunda-feira (25/2). Os servidores serão citados e têm prazo de dez dias para apresentar defesa e indicar testemunhas. Uma médica que havia sido denunciada por homicídio culposo, por ter se atrasado para o turno de trabalho quando prestava atendimento em outra cidade, teve a denúncia rejeitada pelo juiz. O juiz também arquivou o procedimento em relação a outras cinco pessoas investigadas (Autos n. 0001364-45.2017.8.24.0041).
RELEMBRE O CASO
O fato ocorreu há uma ano, na época Heloísa foi internada no Hospital São Vicente de Paulo (HSPV) com quadro de pneumonia. Após 24 horas o quadro clínico da criança piorou necessitando fazer o internamento dela na UTI. Como o HSPV não possui UTI infantil, foi solicitada uma vaga no Hospital Infantil dr. Jeser Amarante Faria em Joinville, que atendeu o pedido prontamente.
Após a confirmação da vaga começou o sofrimento da família, pois o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) de Mafra informou que a ambulância não poderia fazer o transporte da paciente por falta de combustível. Solicitaram então o serviço do SAMU de Rio Negrinho e foram informados que a ambulância estava sem médico e também não poderia fazer o translado. Quando pediram para o SAMU de Canoinhas levar à paciente foram informados que a ambulância só poderia ir até Rio Negrinho, pois também estava com falta de combustível, e em Rio Negrinho uma ambulância de Jaraguá do Sul completaria o transporte.
Mesmo com apelos dos pais que queriam a todo o custo abastecer as ambulâncias o SAMU informou que o abastecimento não poderia ser feito por terceiros e o translado da bebê Heloísa Mathias Lisboa levou cerca de 15 horas, quando o tempo médio de viagem entre Mafra e Joinville é de duas horas.